Dois

Prosas e Poesias, Cerejas e Mares

Um instante
Não me olhes sequer, deixa só que eu me veja assim. E tambem que te espreite, quando partes e finjo dormir. MPC

 

Num instante era Verão e noutro Outono.

Assim mesmo,

Sem que nada de concreto se tenha passado.

Um tempo que deu lugar

A outro, ciclo ou linha sem fim.

Sem se notar o momento, o gesto,

O corpo ou o verbo.

Toquei sem querer na tua mão,

Quando estávamos no café.

Senti que imediatamente fugiste,

Dela. Instintivamente, como um salto,

De animal selvagem. De rasgão.

Sobressalto que não notaste.

Só eu senti essa fuga. E em silêncio

Assustei-me. Não gritei de modo a

Esconder alguma palavra, que

Escapando diria tristeza. Ou nem isso.

Tristeza que se enrolou em mim,

Abafando-me, embrulhando-me,

Para que qualquer gesto

Aconteça sempre comigo imóvel.

E assim disfarço todo esse

Lamentável, inesperado,

Injustificável e inútil gesto

Da minha mão.

Se tivéssemos observado bem,

Esse gesto aconteceu quando

a tua mão já estava em fuga.

Embrulho-me mais dentro

Deste corpo. O meu

Que não posso evitar de conhecer.

Quando voltar a tocar a tua mão

Não será acidentalmente. Prometo.

Mas promete-me que não foges.

Diz-me somente para eu partir

De repente. Num instante

Entre o Verão e o Outono.

Entre essa tristeza e a primeira lágrima que corre.

Paris, 9/X/2012

Posted in

Deixe um comentário