Dois

Todas as coisas se podem comprar. Mas nem todas estão à venda. Houve um tempo que passámos a atribuir um valor a tudo. Já o fizemos até com as pessoas, com a escravatura. E agora? Privatizamos a água? É legitimo? E o ar? Será legitimo?

Deixarei uma pegada ecológica, e também uma pegada humana, no sentido dos valores que deixarei, daquilo que influenciou os outros. Influeciei alguém? Alguém, por minha influência, mudou a sua conduta? Tornou-se melhor pessoa? E o que isso de nos tornarmos melhores pessoas? É a isto que chamo pegada humana. Aquela que nos permitirá a possibilidade de haver uma próxima geração e outra, e outra…O futuro.

A minha pegada humana serão as lembranças que os outros terão de mim depois de eu morrer. Nada mais. Simplesmente, e com a complexidade decorrente disso, essa será a minha pegada humana. Engloba a ecologia, os valores, as utopias, os dias tristes e os alegres. Engloba como vivi comigo mesmo e com os outros.

Enquanto uma árvore cortada valer mais que uma árvore viva, a sustentabilidade ambiental não é possivel. O valor atribuido, ou por vezes até percepcionado, influência decisões. Num mundo onde a economia domina, tudo tem um valor. Qual o valor do ar puro? De um rio de águas límpidas? Qual o valor a pagar se houver uma descarga que polui um rio? Se eu incendiar uma floresta, que me acontece? Vou preso por menos tempo? Certamente menos tempo, que o tempo que a natureza demora a reparar esse dano. Que valor acrescido atribuo a um apartamento situado numa cidade despoluída, sustentável? Os interesses das cimenteiras, da industria do papel, da produção intensiva, da criação industrializada de animais, dominam. Parece haver uma impotência para mudar este tipo de coisas. A responsabilidade social de algumas empresas não existe verdeiramente. A exploração do subsolo, dos mares, o crescimento demográfico das cidades, tornão a vida impossivel. É uma questão de tempo. Quanto tempo? Escrevo estas frases e tudo me parece um enorme dejá vú. Todos já pensamos e escrevemos isto. Cada um de nós é insignificante para resolver o problema, e parece que mesmo todos juntos também continuamos numa impotência dolorosa. Mas continuamos. Reciclamos e não mandamos as beatas para o chão. Já não é mau para poder adormecer descansado. Mais uma Cimeira, mais uma COP, e tudo se mantém. O problema é global, e por isso de difíceis acordos concretos para soluções, para implementações de políticas novas. Há sempre alguém que não cumpre, porque somos muitos, e por outro lado o não cumprimento não resulta em sansão nenhuma. Voltamos ao início. Abato só esta arvore. Hoje. Há mais árvores. O problema é que não sou só eu a abater, e tambem há mais dias para o fazer.